Na primeira quinzena de agosto, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), entidade da sociedade civil organizada que reúne policiais, pesquisadores e gestores públicos da área, divulgou sua 12ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Entre os dados e informações tornados públicos estão as mortes violentas intencionais de 63.880 pessoas, somente no ano de 2017. Pela primeira vez em décadas, o país atingiu o obsceno e indecente patamar de 30 mortes violentas (homicídios, lesões corporais seguidas de morte e latrocínios) por 100 mil habitantes, uma das maiores taxas entre os países da América Latina, somente atrás da Colômbia (48,8), da Venezuela (51,7), de El Salvador (63,2) e de Honduras (85,7).
Ainda segundo o Anuário 2018 do FBSP, 367 policiais foram mortos em confronto e 5.144 civis restaram vitimados fatalmente por intervenções policiais ano passado. Em outras palavras, cerca de 10% dos crimes violentos letais intencionais praticados no Brasil em 2017 decorreram da ação da polícia. Logo, por óbvio, um maior controle do uso da força teria o condão de reduzir substantivamente esse trágico obituário estatístico de vidas matáveis em território nacional.
E os problemas não se encerram por aí, além desses flagelos, o estudo técnico do Fórum apontou a prática de 60.018 estupros, 1.133 feminicídios (motivados por questões de gênero), assim como de 4.539 mulheres vítimas de homicídios, por causas diversas, no ano de 2017! E esse quadro de dor e violência contra as mulheres brasileiras se dá justamente nos 10 anos de edição da elogiada, nacional e internacionalmente, Lei Maria da Penha, o que denota a pouca efetividade tanto dos mecanismos legais de controle, quanto, e sobretudo, das políticas públicas protetivas levadas a efeito pela União, pelos Estados e pelos municípios.
Além disso, essa publicação sistematizou a existência de 82.684 registros de desaparecimentos de pessoas no ano que findou. Um aprimoramento da gestão da informação no campo da segurança pública, com a análise pormenorizada desses casos, certamente poderia conduzir a explicitação de um número ainda mais elevado de mortes violentas, fenômeno social já identificado em outras localidades das Américas, como na citada Colômbia. Frear a escalada de homicídios, formulando, implementando e avaliando uma política nacional de repressão qualificada e prevenção social desse crime a partir do perfil das vítimas, dos autores, dos fatores de riscos, das circunstâncias e das motivações deveria ser uma prioridade nacional. Todavia, não raro, as autoridades públicas e a sociedade parecem estar anestesiadas pela reiteração dessa forma de violência, naturalizando ou ignorando a premência de soluções mais efetivas, eficazes e eficientes, baseadas em evidências, e não em verborragias inconsequentes que tem nos levado do nada ao lugar nenhum nesse campo.
É fato notório, pois, que a mercantilização do medo e da insegurança apenas agravam essa problemática social que se pretende atacar. Receitas simplistas, tão comum nestes tempos pré-eleitorais, como as que propugnam o mero encarceramento, já se demonstraram descabidas, na medida em que têm servido, principalmente, para auxiliar o crime organizado, liderado por diferentes facções criminais e atores estatais corruptos, a dominar, dia a dia, tanto as ruas como as unidades prisionais superlotadas com mais de 729.463 pessoas, dados de 2016. Note-se, ademais, que há 39.516 pessoas custodiadas, inconstitucionalmente, diga-se de passagem, em Delegacias de Polícia, mais um sinal de que a pré-modernidade continua campeando, com volúpia, no século XXI (sic). Pensando nisso, e procurando contribuir concretamente para a superação desse estado de coisas na área da segurança pública, o Instituto Fidedigna lançará, no dia 27 de agosto, no Complexo Cultural Vila Flores, em Porto Alegre, 100 propostas para a paz a serem entregues a todos os candidatos ao Governo do Estado do Rio Grande do Sul!